{ "@context": "http://schema.org", "@type": "Article", "mainEntityOfPage": { "@type": "WebPage", "@id": "https://aventurasnahistoria.com.br/noticias/reportagem/existe-realmente-uma-cidade-subterranea-secreta-sob-piramides-do-egito.phtml" }, "headline": "Existe realmente uma cidade subterrânea secreta sob as pirâmides do Egito?", "url": "https://aventurasnahistoria.com.br/noticias/reportagem/existe-realmente-uma-cidade-subterranea-secreta-sob-piramides-do-egito.phtml", "image": [ { "@type":"ImageObject", "url":"https://image.staticox.com/?url=https%3A%2F%2Faventurasnahistoria.com.br%2Fmedia%2Fs%2F2025%2F05%2Fah-padrao-2025-05-16t105602923.jpg", "width":"1280", "height":"720" } ], "dateCreated": "2025-05-17T13:00:00-03:00", "datePublished": "2025-05-17T13:00:00-03:00", "dateModified": "2025-05-17T13:00:00-03:00", "author": { "@type": "Person", "name": "Luiza Lopes" }, "publisher": { "@type": "Organization", "name": "Aventuras na História", "logo": { "@type": "ImageObject", "url": "https://aventurasnahistoria.com.br/static/logo/ah.svg", "width":"120", "height":"60" } }, "articleSection": "Mat\u00e9rias", "description": "Nos últimos dias, viralizou a alegação de que uma vasta cidade de 38 mil anos teria sido descoberta sob a pirâmide de Quéfren, no Egito\u003B entenda!" }
Busca
Facebook Aventuras na HistóriaTwitter Aventuras na HistóriaInstagram Aventuras na HistóriaYoutube Aventuras na HistóriaTiktok Aventuras na HistóriaSpotify Aventuras na História
Matérias / Egito

Existe realmente uma cidade subterrânea secreta sob as pirâmides do Egito?

Nos últimos dias, viralizou a alegação de que uma vasta cidade de 38 mil anos teria sido descoberta sob a pirâmide de Quéfren, no Egito; entenda!

Luiza Lopes Publicado em 17/05/2025, às 13h00

WhatsAppFacebook
Pirâmide de Quéfren, no Egito - Getty Images

Nos últimos dias, viralizou nas redes sociais a alegação de que uma vasta cidade de 38 mil anos teria sido descoberta sob a pirâmide de Quéfren, no planalto de Gizé, no Egito. A teoria foi apresentada por dois italianos — o químico aposentado Corrado Malanga e o especialista em sensoriamento remoto Filippo Biondi — que afirmam ter identificado estruturas subterrâneas colossais a quase dois mil metros de profundidade. 

Segundo eles, o suposto complexo incluiria oito poços com rampas em espiral, duas câmaras cúbicas com até 90 metros de lado e outras cinco edificações interligadas, formando o que sugerem ser uma antiga cidade enterrada ou até uma usina de energia pré-histórica.

A equipe afirma ter usado tecnologia SAR (radar de abertura sintética), normalmente empregada em escaneamentos de relevo terrestre e oceânico, para “mapear” o subsolo da região.

De acordo com a porta-voz do projeto, Nicole Ciccolo, os dados indicariam ainda um sistema que conectaria as três pirâmides principais de Gizé por túneis e câmaras subterrâneas — o que, segundo ela, poderia se relacionar às míticas “Salas de Amenti”, um conceito esotérico de origem egípcia associado ao submundo e à sabedoria ancestral perdida.

O anúncio foi feito em coletiva de imprensa, acompanhado por imagens geradas por inteligência artificial (IA) com base em interpretações dos sinais de radar. A pesquisa, no entanto, não foi publicada em revista científica nem submetida a revisão por pares.

cidade
Modelo 3D apresentado por Corrado Malanga e Filippo Biondi de cidade subterrânea sob a pirâmide de Quéfren/ Crédito: Reprodução/Facebook (Khafre Research Project SAR Technology)

Críticas

A teoria rapidamente atraiu críticas da comunidade acadêmica, especialmente de arqueólogos e cientistas com experiência em geofísica e sensoriamento remoto. Um dos principais pontos de contestação é o alcance do radar SAR. 

O arqueólogo Flint Dibble, da Universidade de Cardiff, afirmou em entrevista ao site do National Geographic que esse tipo de tecnologia, mesmo nas melhores condições, só penetra poucos metros no solo. Detectar algo a dois mil metros de profundidade seria tecnicamente impossível.

A crítica é compartilhada por Sarah Parcak, arqueóloga especializada em imagens de satélite aplicadas à arqueologia, que foi ainda mais categórica:

Com manipulação suficiente, posso fazer qualquer imagem de satélite parecer o que eu quiser. E acho que é isso que eles fizeram. Os dados do SAR simplesmente não atravessam rocha, ponto final”, disse ao site. 

Lawrence Conyers, professor da Universidade do Arizona e referência no uso de radar de penetração no solo em contextos arqueológicos, também classificou a teoria como “um grande exagero”. Em entrevista ao Daily Mail, ele destacou que as ferramentas atuais não têm a capacidade de gerar imagens confiáveis em profundidades tão extremas.

Já o arqueólogo egípcio Dr. Zahi Hawass, ex-ministro das Antiguidades, classificou as alegações como “sem fundamento” e lembrou que o Conselho de Antiguidades do Egito não concedeu autorização para esse tipo de estudo na pirâmide de Quéfren.

Geologia local

Outro ponto ignorado pelos autores diz respeito à geologia básica do planalto de Gizé. Um estudo conduzido por Sharafeldin et al. (2019), publicado no periódico Geoscientific Instrumentation, Methods and Data Systems, demonstrou que o lençol freático da região se encontra a poucas dezenas de metros da superfície. 

Essa proximidade com a água subterrânea é tão significativa que até hoje provoca erosão em monumentos como a Esfinge, causada pela umidade ascendente do solo. Assim, a ideia de estruturas localizadas a dois mil metros de profundidade é geologicamente insustentável: qualquer construção nesse nível estaria completamente submersa, sem possibilidade de o, ventilação ou preservação.

Como ironizou Dibble, não se trataria de uma cidade antiga, mas de algo mais próximo de uma “Atlântida submersa”.

As alegações de Malanga e Biondi também contradizem mais de dois séculos de pesquisa arqueológica no local. Gizé é um dos sítios mais estudados e escaneados do mundo. Escaneamentos com múons (partículas subatômicas), radar de solo, tomografia elétrica, sísmica de refração e extensas escavações arqueológicas já forneceram um panorama detalhado do subsolo do planalto.

Nenhum desses estudos apontou para a existência de túneis ou cidades subterrâneas de grande escala. Embora câmaras menores e corredores subterrâneos existam — alguns conhecidos desde a Antiguidade —, eles são pontuais e compatíveis com as técnicas construtivas egípcias. Nada sugere uma rede maciça ou uma estrutura enterrada tão profundamente quanto a proposta pela dupla italiana.

Além disso, as imagens em 3D divulgadas pela equipe não derivam de dados empíricos verificáveis. Foram criadas por IA com base em interpretações subjetivas dos sinais de radar — o que levanta dúvidas não apenas sobre sua precisão, mas sobre sua legitimidade como representação científica.

De onde vêm essas ideias?

A ideia de agens e câmaras secretas sob as pirâmides não é nova. Remonta aos escritos de Heródoto e foi reciclada ao longo do século 20 por esotéricos como Edgar Cayce, que falavam sobre salas ocultas contendo registros da Atlântida.

A popularização dessas narrativas encontrou terreno fértil na cultura pop e em teorias pseudocientíficas que defendem a existência de tecnologias antigas ou a intervenção de alienígenas na construção dos monumentos.

Segundo Dibble, a atual teoria viraliza por reunir vários elementos eficazes: títulos acadêmicos, jargão técnico, inteligência artificial e uma narrativa que desafia a chamada “arqueologia tradicional”. Para muitos, isso basta para parecer crível — ainda que careça de evidências.

A construção das pirâmides, ao contrário do que sugerem essas teorias, é amplamente explicada pela engenharia egípcia, baseada em mão de obra especializada, técnicas sofisticadas e conhecimento logístico.

Durante o Antigo Império, o braço Kufu do rio Nilo chegava até o planalto de Gizé, o que facilitava o transporte das enormes pedras utilizadas na construção. Estudos recentes, como o de Sheisha et al. (2022), disponível no periódico Proceedings of the National Academy of Sciences, confirmam que a geografia da época era favorável a esse tipo de empreendimento.

Ou seja: não há necessidade de recorrer a civilizações perdidas, cidades submersas ou engenharia alienígena para entender o que, de fato, já foi bem estudado. Como resume Dibble: “Não precisamos de teorias mirabolantes quando temos água.”